Nas Asas da Monarca
A borboleta monarca em um voo de esforço, porém elegante, atravessa o mar, passa ao lado da canoa, se esforça, quase toca a água, mas continua. Visão inusitada dos tripulantes que a contemplam, o mar prestes a absorvê-la. Nesta trajetória, com suas asas de seda, atravessa o espaço e dá sentido a uma grandeza por demais abstrata, o tempo.
O tempo dividido em antes, durante, e depois, só oferece lógica se observado a partir do movimento das coisas do mundo. O tempo revela-se fruto do pensamento e está ausente no mundo concreto, como toca-lo? O que o evidencia são coisas que se movem, como o voo da monarca, as águas de um rio, as folhas ao vento, as ondas do mar, as estrelas que giram em rotações e translações sem fim. Observar um quadro de imagens antigas da cidade, além de nostálgico, dá aos olhos a sensação de que algo ficou lá atrás, de que atravessamos um campo chamado tempo. Num horizonte tão distante quanto o universo, os olhos não alcançam o passado e nem tão pouco o futuro, estes se misturam em um espaço infinito. A morada da vida, a nave mãe Terra, tal como um rato na esteira, tangencia o sol em 30 metros por segundo em sua viagem eterna. Assim como os elétrons se deslocam em órbita circular, ao redor do núcleo. Só porque “navegar é preciso”. É um movimento que, de tão eterno, soa estático como os ponteiros de um relógio sem corda. Qual o sentido do tempo aqui? Presa como uma pérola no colar, a Terra em sua trajetória, faz o passado ressurgir com exatidão, e prediz os passos da próxima hora. Por aqui, nossa esforçada e elegante monarca, em seu curto e improvável voo, traz à tona a relação do tempo com a sensação de finitude da vida. Mas, se com cuidado e destreza, olhamos para além das cores de suas delicadas asas, encontramos compondo a sua forma partículas tão pequenas como o carbono. Este, a base de toda a vida. Como num jogo de dominó, onde o número de peças é sempre o mesmo, o universo material se movimenta entre o antes e o agora. Neste jogo, as peças apenas mudam de lugar. Todas as coisas do mundo são feitas das mesmas coisas de sempre. Sobre a vida, qual o seu real tempo? Um simples átomo de carbono, presente hegemonicamente no mineral mais duro, e de maior brilho, o diamante, também é passageiro e viajante nessa trajetória de tempo e espaço da nossa monarca. Hoje, de carona em suas asas, este carbono atravessa o mar, mas em verdade faz parte de uma viagem muito maior. Muito antes, certamente, esteve vivo ao estar presente em coisas como a cauda de um dinossauro, há séculos! De uma forma muito incrível - a vida é assim - ao se observar um quadro de época na parede tem-se a sensação de que o passado continua em algum lugar. Aqui, o pensamento é tão abstrato quanto o tempo que procura criar. O quadro, com sua imagem, congela este tempo, mas não a vida e o movimento das coisas do mundo. A natureza cíclica da matéria dá bem a dimensão de que, o que marca o tempo, em sua plenitude, são as várias formas que a vida assume nesta trajetória. As partículas da vida viajam pelo espaço, tal como a monarca, em seu voo, e assumem várias formas de viver. Já o tempo, o que dizer? É tão abstrato, quanto o pensamento, e só existe em função dele.
Gladyston Costa
Enviado por Gladyston Costa em 30/06/2018
Alterado em 09/04/2021 |