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Pão de Ló e o doce da vida

 

A atmosfera  está cinza pela manhã e ofusca  o sol que se espreme entre as nuvens, é possível ver de cima do viaduto. O cheiro do café fresco não é suficiente para trazer à memória os tempos de leveza da juventude. Os olhos dialogam com as luzes vermelhas dos carros em marcha lenta à frente, toneladas de ferro sobre o frio asfalto da cidade a conduzir pessoas solitárias. Atrás do volante o corpo ainda reclama a cama que ficou para trás e se intoxica com a rotina que se apresenta, tão repetitiva quanto às luzes das lanternas dos carros pela avenida. Vidas represadas e solitárias  em uma bolha de aço. A face mascada pelo tempo e os fios brancos do cabelo decoram o espelho retrovisor.  Reflexo mudo de uma vida engolida pela razão contida nas linhas retas dos edifícios e calçadas, com suas lojas de departamento e bancos mercantis.

 

O padrão de vida no mundo do mercado é baseado na felicidade  (pseudofelicidade) concebida pela ganância do consumo.

O acúmulo sem fim de produtos voláteis.

 

O céu é cinza e o vento é frio  nessa manhã de outono em São Paulo . Os olhos cansados e o corpo pesado e sonolento faz a mente buscar conforto em lugares distântes . O tempo perdido no trânsito é contado pelo valor do dinheiro e a solidão por trás do volante tem a companhia das notícias que vêm do rádio: "Mais um Assalto à mão armada; há caso de peste na malásia; o preço do petróleo ; a corrupção no governo; o trânsito na cidade".

 

Na avenida o semáforo abre, as buzinas gritam, o fluxo segue lento, as pessoas surtam e a vida é engolida.Somente a pouca luz que brilha do sol que esgueira por entre  as nuvens, ameniza a rabugice da manhã cinza.

 

A luz que transpassa o para-brisa faz a mente viajar no tempo, então os pés mal tocam o chão.O corpo leve parece voar e o vento toca o rosto com intensidade crescente. Os semblantes com sorrisos pululam e os bilhetes e beijos são doces como mel. Um Oásis nesse mais um dia de rotina que começa na cidade. Um pão de ló com uma bela cobertura de chocolate ou outra guloseima qualquer que escorre pelos dedos.  É assim que a vida por vezes se apresenta quando se realmente está feliz.

 

Na vida vivida a preço de mercado,  o doce da vida esvai e as obrigações  de cidadão consumidor com suas contas e impostos a pagar se impõe.  A racionalidade matemática da vida baseada no consumo, com seu céu cinza em manhãs cáusticas, é uma armadilha no caminho da real felicidade. Tem-se  que  transgredir essa lógica, pois  coisas como o vento que bate no rosto e o sol que aquece a terra não tem preço. Os dias escravizados pela rotina são uma realidade cruel, uma dicotomia  entre os desejos materiais  superficiais e uma vida realmente plena de felicidades.

 

A conta da felicidade baseada no consumo nunca fecha!!

 

O bolo da vida com seu recheio na superfície deve ser colocado em um liquidificador e misturado para que o doce do recheio perdure. O arrepio dos beijos apaixonados, das corridas pelo campo, do canto dos passarinhos, do sol na pele, do aroma das flores (...)deve ser saboreado do início ao fim para que a vida realmente seja vivida.

 

Lambuzemo-nos com essas guloseimas gratuitas, pois o melhor da vida não tem valor monetário.

 

Gladyston Costa

 

Gladyston Costa
Enviado por Gladyston Costa em 09/05/2019
Alterado em 10/12/2021


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